Uma
das coisas que torna minha rotina em São Paulo suportável é o fato de eu morar
a 600 metros do trabalho, que se traduzem em oito minutos de caminhada por
trecho: oito minutos para ir, oito minutos para voltar, fora o almoço.
Apesar
da pouca distância, há algumas diferentes opções de caminhos que posso escolher.
Em um deles há uma casa com dois cachorros: um Golden Retriever e um outro,
cuja raça desconhecia até recentemente. Tendo vivido com um Golden Retriever
por um bom tempo e me aficionado pela raça, sempre que passava por ali detia-me
por alguns instantes para acariciá-lo. Seu companheiro latia, talvez enciumado,
talvez enfurecido. Como não conhecia a raça — que se assemelhava a um Pit Bull — optava por ignorá-lo, evitando, assim, que meu braço fosse arrancado.
Até
que na sexta-feira passada, durante meus oito minutos de caminhada em direção
ao trabalho, encontrei uma mulher caminhando com aquele que parecia ser o
temido companheiro do meu amigo Golden Retriever.
—
Bom dia! Desculpe incomodá-la, mas é você que mora na casa ali da esquina, onde
tem também um Golden Retriever?
—
Não, não.
Um
pouco surpreso e desapontado, decidi que ela, ainda sim, poderia esclarecer a
dúvida que me afligia diariamente.
—
Ah... É que tem um cachorro igualzinho ali naquela casa e eu nunca sei se ele é
bravo ou não. Que raça é?
—
É um Bull Terrier. Ele não é bravo, não. Depende do dono, claro, mas em geral
ele é manso — respondeu sorrindo, enquanto seu Bull Terrier procurava o local
ideal na grama para deixar sua marca.
Agradeci,
satisfeito com a resposta, já ansiando pelos oito minutos da tarde, quando
poderia, enfim, dar a devida atenção ao amigo do meu amigo.
Saí
do trabalho às cinco da tarde com um fone no ouvido e fui direto em direção
àquela casa. Os dois cachorros logo se espicharam ao me verem. Aproximei-me do
portão para cumprimentá-los e logo ouvi alguém me chamando na rua. Tirei o fone
de ouvido para ouvir o que os rapazes da moto diziam.
Foi
então que notei a arma apontada pra mim.
Não
foi preciso muito para entender que pediam a carteira e o celular.
Entreguei
a carteira, da qual tiraram apenas o dinheiro, e em seguida o celular, que
sobrevivera três anos e meio sem sequer um arranhão. Jogaram a carteira com os
documentos e os cartões no chão e desapareceram, tão subitamente quanto haviam
surgido.
Olhei
para os cachorros, que me olhavam de volta sem entender o que acontecia, e
finalmente acariciei o Bull Terrier que tanto temia — e que agora rolava no
chão alegremente.
Guardei
os fones de ouvido no bolso e continuei a caminhada de volta para casa, pensando
em qual seria minha nova senha de e-mail e no meu recém-adquirido laptop, que
permanecia intocado na mochila que carregava nas costas.