quinta-feira, 30 de abril de 2015

Sorte ou revés?

Uma das coisas que torna minha rotina em São Paulo suportável é o fato de eu morar a 600 metros do trabalho, que se traduzem em oito minutos de caminhada por trecho: oito minutos para ir, oito minutos para voltar, fora o almoço.
Apesar da pouca distância, há algumas diferentes opções de caminhos que posso escolher. Em um deles há uma casa com dois cachorros: um Golden Retriever e um outro, cuja raça desconhecia até recentemente. Tendo vivido com um Golden Retriever por um bom tempo e me aficionado pela raça, sempre que passava por ali detia-me por alguns instantes para acariciá-lo. Seu companheiro latia, talvez enciumado, talvez enfurecido. Como não conhecia a raça  que se assemelhava a um Pit Bull  optava por ignorá-lo, evitando, assim, que meu braço fosse arrancado.

Até que na sexta-feira passada, durante meus oito minutos de caminhada em direção ao trabalho, encontrei uma mulher caminhando com aquele que parecia ser o temido companheiro do meu amigo Golden Retriever.
— Bom dia! Desculpe incomodá-la, mas é você que mora na casa ali da esquina, onde tem também um Golden Retriever?
— Não, não.
Um pouco surpreso e desapontado, decidi que ela, ainda sim, poderia esclarecer a dúvida que me afligia diariamente.
— Ah... É que tem um cachorro igualzinho ali naquela casa e eu nunca sei se ele é bravo ou não. Que raça é?
— É um Bull Terrier. Ele não é bravo, não. Depende do dono, claro, mas em geral ele é manso — respondeu sorrindo, enquanto seu Bull Terrier procurava o local ideal na grama para deixar sua marca.
Agradeci, satisfeito com a resposta, já ansiando pelos oito minutos da tarde, quando poderia, enfim, dar a devida atenção ao amigo do meu amigo.

Saí do trabalho às cinco da tarde com um fone no ouvido e fui direto em direção àquela casa. Os dois cachorros logo se espicharam ao me verem. Aproximei-me do portão para cumprimentá-los e logo ouvi alguém me chamando na rua. Tirei o fone de ouvido para ouvir o que os rapazes da moto diziam.

Foi então que notei a arma apontada pra mim.

Não foi preciso muito para entender que pediam a carteira e o celular.
Entreguei a carteira, da qual tiraram apenas o dinheiro, e em seguida o celular, que sobrevivera três anos e meio sem sequer um arranhão. Jogaram a carteira com os documentos e os cartões no chão e desapareceram, tão subitamente quanto haviam surgido.
Olhei para os cachorros, que me olhavam de volta sem entender o que acontecia, e finalmente acariciei o Bull Terrier que tanto temia — e que agora rolava no chão alegremente.
Guardei os fones de ouvido no bolso e continuei a caminhada de volta para casa, pensando em qual seria minha nova senha de e-mail e no meu recém-adquirido laptop, que permanecia intocado na mochila que carregava nas costas.