sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Um dia a casa cai – o juízo final


Depois de uma odisséia de três meses entre “Ei, gostei da sua ideia” e “Não aguento mais editar esse filme”, chega enfim o dia da exibição do filme “Tree House” – o “The” inicial foi eliminado, não me perguntem porquê.
Dois filmes são apresentados em cada exibição. O nosso é o segundo do dia. 
Nove e meia da manhã, o primeiro filme já vai começar. 
- Cadê o nosso diretor de fotografia?
Nossa produtora tenta seu celular. Ninguém atende. Tenta seu colega de apartamento. Nada. Provavelmente, ele está dormindo. Não seria a primeira vez.
O primeiro filme termina: uma comédia… em que ninguém deu risada. A equipe assume a frente do auditório e se prepara para receber críticas de cento e trinta alunos, sem contar o corpo docente. A maioria delas é bastante negativa. O professor definitivamente não está feliz com o resultado.
Hora do intervalo. Nada do diretor de fotografia. Um dos meus colegas se aproxima com um sorriso de orelha a orelha: 
- Relaxa, Filipe, depois desse filme-bomba, qualquer coisa vai parecer uma obra-prima.
Embora não queira pensar no nosso curta como “qaulquer coisa”, sua linha de raciocínio faz sentido. Além disso, todos sabem dos problemas que tivemos na produção e pré-produção. As espectativas dos colegas não são lá muito altas.
Voltamos ao auditório. O diretor de fotografia chega correndo. “Desculpa, pessoal, o despertador não tocou!”
Começa o filme. Nossos nomes são aplaudidos pelos colegas conforme aparecem nos créditos iniciais. Estou sentado do lado da editora. Prestamos mais atenção na reação das pessoas do que no filme em si. Vinte minutos depois, termina o filme. Mais aplausos. Ninguém riu nas cenas dramáticas. Muitos riram das pequenas gags. Alívio. A parte um do julgamento parece não ter ido tão mal.
Se tem uma coisa sobre a qual não posso reclamar é o respeito da minha equipe para com o meu roteiro. Muitos roteiristas tiveram problemas sérios com seus diretores, que se achavam no direto de alterar completamente as ações e principalmente o diálogo. Meu diretor não mudou praticamente nenhuma palavra. Salvo raríssimas exceções, tudo o que escrevi foi filmado, e praticamente cem por cento sobreviveu ao corte final.
Assumimos a frente do auditório. Apresentamo-nos. Uma vez lá, não podemos dizer nada, apenas ouvir. O professor – que aliás, é ninguém menos que Gill Dennis, o roteirista de Johnny & June – começa a discussão.
- Quem é o protagonista? Quem é o antagonista?
Alguns colegas vão respondendo às perguntas. Ele começa a ir mais fundo.
- Quem gostaria de ter sido informado sobre a profissão do genro mais cedo na história?
Alguns levantam a mão.
- Quem acha que não ficou claro o motivo pela qual ele estava construindo a casa na árvore?
Mais algumas mãos.
À medida que vamos avançando na discussão, fica claro que Gil não está satisfeito, sobretudo com a direção. Quanto mais ele critica o filme, porém, sinto que mais o público o defende.
- Acho que deveria ter ficado mais claro desde o início o motivo pelo qual ele está construindo a casa na árvore – ele argumenta.
Uma colega discorda. “Não gosto de filmes que me tratam como idiota. Gostei que o filme deixou algumas coisas em aberto, sem prejudicar a história”.
Outro colega a apoia: “Acho que se ficasse claro desde o início o quanto o pai gosta da filha, o personagem não teria nenhuma progressão durante o filme”.
-  Não fiquei convencido de que o pai e a filha se amam de verdade – continua o professor. – Quem acha que o pai realmente ama a filha?
Praticamente todos levantam a mão.
- Quem acha que a filha realmente ama o pai?
Novamente, quase todos levantam a mão.
A discussão termina. Talvez esteja enganado, mas saio com a impressão de que a maioria dos colegas se surpreendeu positiviamente com o filme. Partimos para a sessão para elenco, equipe e convidados. Os atores ficam satisfeitíssimos. Seguimos, então, para a última etapa: a análise do filme, pausando cena a cena, apenas com equipe e professor presentes.
Gil Dennis claramente não é um grande fã do filme. Ele aponta cada um dos problemas técnicos – todos bastante válidos, devo admitir. Aponta, também, é claro, os pontos positivos. A cena que mais me desagrada, por exemplo, é uma das cena que menos o incomoda… No início, nosso diretor está um pouco defensivo. Aos poucos, os ânimos se acalmam e todos voltam a enxergar as críticas como forma de aprendizagem. E sob essa perspectiva, fazer esse filme foi uma jornada e tanto.
Aprendi a colaborar com diretor, produtor e todo resto da equipe. Aprendi que o que vemos na tela nunca é exatamente o que imaginamos. Aprendi muitíssimo sobre a função de cada membro da equipe e o quão trabalhoso é tirar um filme do papel. Aprendi que quinze páginas de roteiro talvez seja muito para uma filmagem de quatro dias. Aprendi, principalmente,  que a maior parte dos problemas se dá por falta de comunicação.
É claro que não sou apaixonado por toda e qualquer passagem do filme. Não gosto de algumas reações, alguns diálogos não saíram exatamente como eu imaginava, alguns elementos que pra mim eram claríssimos no papel passam desapercebidos na tela. Sem dúvida, muitos apreciaram os vinte minutos de filme. Outros odiaram. Não importa. Valeu a pena. Apesar de todos os percalços, me diverti demais. Aprendi demais.
E é por isso que se me perguntam: qual o resultado final? 
A minha resposta: foi um sucesso.