“Esqueceram de Mim” foi o primeiro filme que vi no
cinema. A extinta sala 3 do cinema da Paris Filmes do Shopping Ibirapuera tinha pouco mais de
100 lugares — provavelmente uma das menores da cidade, mas eu não sabia disso.
Muito menos sabia que 15 anos depois trabalharia naquela empresa que por tanto
tempo estampou os ingressos dos filmes que vi na adolescência.
A
sala estava lotada, e alguém sentou na poltrona à minha frente, bloqueando
parte da minha visão. Migrei para a poltrona ao lado, dividindo o espaço com
uma amiga. Do mesmo assento, assistimos fascinados às aventuras de Kevin McCallister, interpretado por aquele
ator que não sabíamos o nome.
Era
1991 e, para um garoto de sete anos de idade, qualquer assunto que não
estivesse nos livros da escola, na Barsa (onde?!) ou em alguma revista era
completamente inacessível — incluindo o nome do ator que interpretava Kevin
McCallister em “Esqueceram de Mim”.
Um
ano inteiro se passou até que uma reportagem da revista Veja enfim revelou o
grande mistério.
Revista Veja. 15/01/92. |
Disquei
do telefone vermelho para o 571-6291 e minha colega de poltrona atendeu.
—
Descobri o nome dele! Adivinha! Começa com M!
O
mundo mudaria muito nas décadas seguintes, conectando pessoas e espalhando
informações de forma inimaginável. Levei 20 minutos para encontrar a
reportagem da foto, e pareceu uma eternidade. Hoje basta um clique — literalmente — para saber que Macaulay
Culkin é fã de luta livre e World of Warcraft, mede 1,70m e divorciou-se após
dois anos de casado.
A Liv
Tyler da
capa do meu fichário hoje está no meu Instagram, onde descobri que seus filhos estão grandes
demais para pijamas de bichinhos, e onde posso acompanhá-la enquanto anda a
cavalo com a família. É possível até mesmo alfinetar um presidente e receber a
resposta por Twitter minutos depois.
Aqueles
que até recentemente estavam tão distantes de nós agora parecem estar aqui do
lado, suas vidas conectadas às nossas, nossos celulares notificados a cada
passo. Mas quanto dessa conexão é real?
Há
alguns anos gravei a narração para o teaser de um longa-metragem em desenvolvimento nos EUA. O
produtor/editor me conheceu pessoalmente alguns meses depois.
— Cara,
parece que eu te conheço há séculos, de tanto que eu já ouvi sua
voz! — disse ele no primeiro aperto de mãos.
Sinto
que conheço profundamente o apresentador e os convidados de um programa
semanal — “Conectados”, vejam só — que legendo há mais de um
ano para uma companhia aérea. Até que nos cruzamos pelos corredores e me dou
conta de que nem sabem que eu existo. Por que saberiam?
Como
roteirista de vídeos corporativos, já perdi a conta de quantas vezes escrevi a
frase: “O mundo está cada vez mais conectado”.
Agora
só falta dizer: conectado com o quê?
Outro dia fui ao cinema com a mesma amiga — cada um
em sua poltrona. Não conseguia lembrar que outro filme o ator do trailer tinha
feito. Puxei o celular, abri o IMDb e
conferi toda sua filmografia. Depois coloquei o aparelho no modo avião para me
desconectar do mundo e enchi a mão de pipoca, aguardando o filme começar.