sexta-feira, 26 de abril de 2013

E.R. - Segunda temporada

Outro dia tive que fazer uma ressonância.

Não sou do tipo que tem problemas para ir ao médico, fazer exames ou ir a hospitais. Sempre concordei com uma amiga que diz: “hospital é onde você vai pra se curar”. Com esse espírito, cheguei ao laboratório preparado para entrar no tubo barulhento e descobrir o que é que faz minha coluna doer.

Na recepção, respondo a perguntas do tipo: “Você já levou um tiro?”, “Tem algum projétil alocado no corpo?”, “Você usa prótese peniana?”. Assinalo “ainda não” em todas as perguntas, descrevo os remédios que estou tomando e sigo para a sala de exames. A enfermeira olha a minha ficha:
- Dor na coluna, né? Já tá tomando antiinflamório...
- Não, não. – interrompo.
- Ué, tá aqui: minoxidil.
- Minoxidil é um remédio pra queda de cabelo.
- Ah... Bom, pode deixar suas roupas ali no armário e se trocar naquela sala.

De camisolinha e bunda de fora, volto para a sala de exames. Ela pede para que eu me deite e aguarde. Minutos depois, ouço alguém vomitando nas proximidades. A enfermeira tenta uma conversa:
- Você tá bem? Fala comigo. O que o senhor tá sentindo?
[grunhidos]
A enfermeira volta para a sala onde estou, prepara uma seringa e sai novamente. A pergunta se repete. O grunhido se repete. Ela volta para preparar mais uma seringa.
- Vem cá, eu vou ter que tomar contraste? – pergunto.
- Ah, não... Mas isso não é por causa do contraste. É que ele tá em jejum.
Ela parte. 
“Mas eu também estou de jejum, porque me MANDARAM estar em jejum” – penso.
Antes de sair, ela solta um animador:
- Pode relaxar porque ainda vai demorar um pouquinho...

Uma médica passa pela minha sala.
- Você está em jejum?
- Sim.
- Há quanto tempo?
- Umas seis horas.
- Seis!?
Ela parte, chocada. Ouço-a comentar com outro enfermeiro:
- Leva umas bolachinhas pro outro paciente que ela tá há seis horas sem comer.
O enfermeiro entra com um Toddyinho e uma bolacha de água e sal.
- Mas eu não tinha que estar em jejum?
- Só se for tomar contraste, mas você não precisa.
E não podiam ter avisado antes?

O paciente moribundo é trazido para a sala ao lado. A médica insiste:
- Antonio, fala comigo. Como você tá se sentindo? Tá melhorando?
[grunhidos]
- Não tô entendendo. O enjoo passou, Antonio?
- Marcos...
- Hein?
- Meu nome é Marcos...
- Ah, perdão. Tá melhor, Marcos?
- Não consigo respirar...

A enfermeira decide, enfim, chamar uma ambulância:
- Boa noite. Temos um paciente aqui que fez uma ressonância e está passando mal. Parece ter febre, sudorese fria, dificuldade para respirar... Idade? 70. Não, espera! Ah, ele nasceu em 70... Ele tem 33. Não! 43.

Com a ambulância a caminho, o enfermeiro volta à minha sala.
- Só vou terminar de limpar o aparelho e já te levo.
Ele sai e conversa com a médica.
- Já vou levando ele lá e posicionando no aparelho, tá?
- Mas você sabe o que tem que fazer?
- Ué, não é só empurrar a maca?

A essa altura, toda minha tranquilidade já foi pro espaço e a confiança no serviço médico foi substituída pela certeza da morte iminente.

O enfermeiro volta.
- Vamos lá?
Será que eu preciso mesmo saber porque minhas costas doem?
- Me diz uma coisa, quanto tempo demora o exame?
- Uns 40 minutos.
- Quarenta!?
- É que são dois exames, né?

Resignado, sou levado para a sala recém-higienizada. Ele coloca a maca na posição, me indica o botão do pânico e, em poucos segundos, estou dentro de um tubo que passa a 20 centímetros da minha cara.
- Então se eu entrar em pânico é só apertar aqui?
...
Ele já foi.
Entro em pânico. Aperto o botão freneticamente. A voz dele surge pelo auto-falante da máquina.
- Tá tudo bem?
- Tá. Só queria ver se isso aqui tava funcionando.
- Ah, OK. Vamos começar.
O barulho ensurdecedor começa. Minutos depois, uma voz robótica sai da máquina: “Não engula”.

Era o mesmo que dizer “não pense num elefante”.

Cerca de meia hora depois, a tortura termina. Sobrevivo. Visto a roupa e pergunto à enfermeira sobre o tal do Marcos:
- Ele vai ficar bem?
- Acho que sim...

Saio do laboratório e pego um táxi, ansioso por um pouco de silêncio e uma noite tranquila. O taxista sorri:
- Tudo bem se eu ligar a TV no Cidade Alerta?